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Em tempos difíceis, onde a morte impõe sua presença, o planejamento sucessório passou a ser uma preocupação. Nessa área, a legislação civil apresenta uma série de limitações à autonomia da vontade, com fundamentos baseados numa sociedade de séculos atrás, que a reforma de 2002 pouco inovou.
O cônjuge ganhou maior destaque a partir da alteração legislativa, passando a dividir a herança com os descendentes ou com os ascendentes do falecido. Ainda passou à condição de herdeiro necessário, ou seja, participará obrigatoriamente na parte indisponível do patrimônio, salvo se for excluído pela prática de algum dos atos previstos no Código Civil.
Na chamada concorrência do cônjuge com os descendentes, o legislador criou uma situação complexa ao condicionar o direito de herança ao regime de bens definido pelo casal.
Confundiu-se, assim, o regime patrimonial da constância da união com os efeitos da morte, regidos pelo direito sucessório.
Durante 18 anos após a mudança legislativa, os tribunais discutiram a questão com o auxílio da doutrina especializada. Em 2017, o STF determinou que os mesmos direitos alcançados ao cônjuge devem ser estendidos ao companheiro na união estável, com base no princípio da igualdade.
O que parecia ser um benefício para os conviventes, tem sido motivo de insegurança jurídica e de desconforto. Ocorre que, ao concorrer com os filhos do falecido, se o regime for o da comunhão parcial ou mesmo o da separação convencional de bens, o cônjuge ou o companheiro sobrevivente tem direito à parte dos bens particulares deixados como herança. Ou seja, se alguém tem filhos, frutos de uma primeira relação, e contrai uma nova união, além da possível divisão sobre os bens adquiridos na constância da nova vida conjugal, o sobrevivente terá direito à herança junto com os descendentes sobre os bens anteriores a essa relação.
Doutrinadores renomados têm defendido a tese de que, em pacto antenupcial ou contrato de convivência, o casal possa decidir sobre a renúncia prévia a esse direito hereditário. Ocorre que os cartórios extrajudiciais negam a inclusão dessa cláusula, baseados no impedimento do "pacto sucessório", que significa uma proibição legal de contratos envolvendo herança de pessoa viva, mesmo que tenha intuito abdicativo de direitos.
Essa posição legalista afeta o livre exercício da vontade e pouco se pode fazer para amenizar essa situação. O aconselhamento mais comum é a utilização do testamento. Porém, como acima se referiu, o cônjuge é herdeiro necessário, o que pode valer também para o companheiro. Nessa qualidade sempre participará, no mínimo, da metade indisponível da herança, chamada de legítima.
Questões patrimoniais integram o direito livre de decisão das pessoas plenamente capazes. A Constituição, à luz dos princípios da dignidade humana e o da menor intervenção estatal, prestigia a autonomia da vida privada. Os tempos são outros, os costumes são outros, resta ao Estado reconhecer essas mudanças.